
La tarde (A tarde)
Daubigny, Charles-François.
Mais informaçãosobre a obra
Obra-prima
Inventário 1894
Obra Exibida
19
Le lever de la bonne é um nu naturalista. Ainda quando o título e alguns elementos da composição o conotam, a pintura pertence ao género que ao longo do século XIX foi campo de batalha das audácias modernistas. Não há narratividade na cena, se limita a apresentar o corpo de uma menina jovem no qual se lê sua pertinência a classe trabalhadora. A simplicidade do mobiliário, as roupas empilhadas sobre um banco de palha, ao pé da cama desfeita e, sobre tudo, o título do quadro, indicam que se trata de una criada. Um foco de luz dirigida partindo da esquerda ilumina esse corpo que se destaca com intensidade dramática sobre o fundo neutro da parede de fundo. A pele da menina é escura, sobre tudo nas zonas que o corpo de uma mulher de trabalho se via exposto ao sol: As mãos, o rosto e as pernas. A criada aparece absorvida na tarefa de vestir uma meia, de modo que o contraste entre os peitos e a mão castigada pela intempérie se faz mais evidente. Cruzadas uma sobre a outra, as pernas, grossas e musculosas se destacam com um tratamento naturalista que se detém na representação meticulosa de uns pés toscos e maltratados. O púbis, invisível após a perna cruzada, se localiza no centro exato da composição. Nenhum destes detalhes passou inadvertido aos críticos que, tanto em Paris como em Buenos Aires, comentaram o quadro em 1887.
Foi pintado em Paris por Eduardo Sívori quem, trás haver alcançado sua aceitação no Salão anual, o enviou a Buenos Aires esse mesmo ano sabendo de antemão que sua exibição geraria polémicas. Foi o primeiro gesto vanguardista na historia da arte argentina.
Sívori ofereceu sua tela em doação a Sociedade Estímulo de Belas Artes, em cuja fundação ele mesmo teve um papel fundamental. A chegada do quadro desde Paris, provavelmente traído por Eduardo Schiaffino, foi precedida por uma serie de artículos de prensa nos quais a mesma Sociedade Estímulo anunciou que era um quadro problemático, que seria de exibição restringida, e que havia recebido em Paris alguns comentários (que foram traduzidos integramente) nos quais se punha em duvida o bom gosto do artista ao encarar semelhante assunto.
Em 1887 a pintura naturalista ocupava um lugar destacado no Salão de Paris, como uma das vias de renovação da estética oficial da Academia. Sem afastar-se muito das convenções formais impostas pela tradição (claro e escuro, perspectiva, tratamento da superfície) os pintores naturalistas seguem uma línea de renovação iconográfica aberta a mediados do século por Gustave Courbet e Jean-François Millet, introduzindo temas derivados da literatura de Émile Zola, o que expunham era uma denuncia direta dos conflitos sociais contemporâneos, em um tom geral narrativo e melodramático. Não foi o nu um género frequente na pintura naturalista. O quadro de Sívori foi em seguida interpretado pela crítica francesa (Roger- Milès, Emery, E. Benjamin, Paul Gilbert, entre eles) como obra derivada de Zola, um pouco “excessivo” na representação de um corpo que foi visto como feio, sujo e desagradável.
Em Buenos Aires, onde não havia havido até então mais que poucas e discutidas exibições de nus artísticos, o quadro foi objeto não só de uma intensa polémica na prensa (foi qualificado de “indecente” e “pornográfico”), mas também de um importante alinhamento de intelectuais e artistas em seu favor. Em uma reunião de sua Comissão Diretiva, no, 22 de agosto de 1887, a Sociedade Estímulo de Belas Artes decidiu exibir o quadro em seu local, preparar convites especiais aos sócios e aos jornalistas da capital, e abrir um álbum que recorreria às assinaturas de todos aqueles “que querem manifestar ao autor suas felicitações pelos progressos realizados”. Mais de 250 assinaturas de artistas, escritores, etc. Estampou-se nesse álbum em cujas páginas Sívori, guardou, além dos recortes das críticas recebidas e fotografias desse e outros quadros seus que haviam sido expostos no Salão de Paris até o seu regresso definitivo em 1891.
A fotografia de Le lever de la bonne conservada nesse álbum apresenta algumas diferenças com o quadro definitivo. Não sabemos se as modificações foram feitas antes ou depois de ser exibido no Salão de Paris. No criado-mudo pode-se ver uma bacia e uma jarra (elementos de higiene) ao invés do candelabro com uma vela apagada da versão final. Por outra parte, na parede do fundo se vislumbra uma estante com frascos e potes sobre a penteadeira. Todos estes elementos se podem ver facilmente ao contemplar o quadro com luz potente, como si o artista houvesse decidido deixar que aqueles arrependimentos se adivinhem no fundo em penumbras. Mas o mais significativo é a mudança na fisionomia da criada. Seu rosto e seu penteado aparecem na fotografia menos escura. A criada parece uma faubourgienne na versão da fotografia. Talvez mais próxima a aparência de uma prostituta (os elementos de higiene também contribuem a isso), assunto predileto da Vanguarda e da crítica social da época. Ainda modificada, a criada foi interpretada como prostituta y considerada pornográfica por vários de seus primeiros comentadores. Sua transformação é significativa. Talvez o artista decidisse afastar-se do “assunto” social de moda ao apresentar-se no Salão. Talvez dedicou transforma-la inequivocamente em uma criada pobre para sua exibição em Buenos Aires.
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