Comentário sobre Alegoria da Fortuna e a Virtude (Alegoría de la Fortuna y la Virtud)
No ano 1630, com seu casamento em dezembro com Helena Fourment, marca para Rubens uma nova etapa em sua vida que será sinalada, entre outros fatos, pelos títulos que recebe dos reis da Espana e da Inglaterra e pela compra da propriedade de Steen pela qual pagou 100.000 florins. Foi nesta década que produz
El jardín del amor (ca. 1630/32, Museu do Prado),
Fiesta de Venus (ca. 1636, Kunsthistorisches Museum, Viena) e a
Kermesse do Louvre de 1630/35, obras que refletem o novo carácter que sua vida havia tomado. Mas também nesta época continuam suas preocupações pela inacabada guerra que comprometia a região e que culminaria com a definitiva divisão entre as Províncias do Norte e as do Sul no que hoje são Holanda e Bélgica. Estas preocupações são as que possivelmente o levaram a produzir obras onde aparecem como temas a paz e a prosperidade que a guerra havia vulnerado. Podemos citar
A Guerra e a Paz (The National Gallery, Londres),
Minerva que protege la paz contra la guerra (Alte Pinakothek, Munich) o
Venus que retiene a Marte (Galleria Palatina, Florencia). Alegorias da Guerra e da Paz aparecem também na iconografia que usou na
Entrada solemne del cardenal infante Fernando de Habsburgo en Amberes, e a elas se somam outras representações de ideias abstratas como Bom Governo, a Fortuna, a Ocasião, a Virtude para armar discursos éticos e morais.
Ante um determinado tema, o artista, trabalhando rapidamente e com um pincel seguro, em poucos traços plasmava uma “invenção”, isso é uma solução para um determinado tema que logo seria levado à tela por ele mesmo ou algum membro de seu atelier com sua supervisão. Tal foi o caso das obras destinadas a
Torre de la Parada, das quais se hão conservado varias, e seria também o caso de nossos rascunhos, se bem não conhecemos nenhuma obra que haja sido realizada partindo dele. Alfredo Hirsch adquiriu-o em 1947, como
Thetis y Minerva, titulado assim a partir das duas mulheres que ali se veem. Uma a esquerda, sentada sobre uma esfera, coberta com um manto que cobre apenas suas pernas e voa atrás das costas com um remo de descanso ao lado dela, abraça e enlaça sua mão direita a da outra mulher que aparece coberta com um manto azul e uma túnica vermelha, usando também um capacete.
A obra pode ser relacionada à
Alegoría de la Fortuna y la Virtud do Museu Grobet-Labadié de Marsella (1), obra do atelier de Rubens realizada entre 1630 e 1635, onde podem ver-se as mesmas mulheres da nossa obra mas em postura invertida. Detrás delas se vem outras duas figuras, um velho alado que desdobra suas asas, tem uma clepsidra em sua mão esquerda e acompanha a uma quarta figura, uma mulher que se distingue por sua cabeça com uma mecha que a figura com capacete tenta agarrar. Michael Jaffé, que descobriu esta obra, a considera uma “alegoria do Bom Governo” - a figura com capacete–, que seguindo o conselho da Fortuna, trata de agarrar a Ocasião que aparece acompanhada pelo Tiempo, o velho com asas. Posteriormente Erwin Panofsky identificou estas figuras como Fortuna e Virtude, mencionando especificamente a nossa obra, onde os elementos se hão reduzido aos dois mais significativos (2). Rubens havia apresentado aqui uma relação amistosa que se reafirma pelas mãos direitas de ambas que se unem o que permite a Panofsky interpretar este tema vinculado ao que indaga de Cicerón,
Virtute duce, comite Fortuna, isso é “com a Virtude como guia e a Fortuna como companheira”. Uma
Alegoría con la vista de la ciudadela de Amberes (3) de 1634 do Musée des Beaux-Arts de Besançon apresenta também iconografia similar.
por Ángel M. Navarro
1— Têmpera e aquarela sobre papel branco, 37,5 x 36,5 cm.
2— Para maiores detalhes da obra, ver: Navarro, 2001. Existe na obra um pentimento que havia que estudar de modo mais detalhado.
3— Madera, 64,6 x 50,5 cm. Ver: J. Held, 1980, nº 275, p. 368.
Bibliografía
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1975. HELD, Julius, “On the Date and Functions of Some Allegorical Sketches by Rubens”, The Journal of the Warburg and Courtauld Institutes, London, vol. 38, (I), nº 24, p. 228.
1980. HELD, Julius, The oil sketches of Peter Paul Rubens. A critical catalogue. Princeton, Princeton University Press, vol. 1, nº A9, p. 628.
1990. BODART, Didier, Pietro Paolo Rubens. Roma, De Luca Edizioni d’Arte, p. 175.
1994. NAVARRO, Ángel M., A pintura holandesa e flamenca (século XVI ao XVIII) no Museu Nacional de Belas Artes de Buenos Aires. Buenos Aires, Associação Amigos do MNBA, p. 71-73, reprod. p. 73.
2001. NAVARRO, Ángel M., Mestres flamencos e holandeses (século XVI ao XVIII) no Museu Nacional de Belas Artes de Buenos Aires. Buenos Aires, Associação Amigos do MNBA, p. 71-73, reprod. color. — NAVARRO, Ángel M., Flemish and Dutch Masters (from the XVIth to the XVIIIth century) at the National Museum of Fine Arts. Buenos Aires, Associação.